full cube
        
        No trabalho de Filipe Alarcão o desenho é um  elemento constitutivo da sua actividade principal, o design. Esta afirmação, aparentemente redundante, leva-nos a  observar a sua obra tendo em atenção alguns objectos produzidos que se  relacionam directamente com a materialização do desenho. Estes objectos, que  quero referir aqui, são os Desenhos a  Duas Dimensões e Meia que estiveram presentes na exposição Introspectiva, no MUDE – Museu do Design  e da Moda, Lisboa, em 2012. Alarcão desenhou estruturas (semelhantes a figuras  geométricas hexagonais) em que as linhas determinam completamente a figura e  são produzidas em aço inox polido, permitindo que, e aqui cito o autor, “de  algum modo, as faces laterais das estruturas se fundam com o plano de apoio destacando  as superfícies frontais como se fossem linhas sem profundidade.”  
        A sua intervenção no projecto EMPTY CUBE vem na  esteira dessas preocupações sobre a tridimensionalidade e as relações espaciais  que aí podem ocorrer. Filipe Alarcão desenvolveu, a partir de um estudo feito  com a maqueta do EMPTY CUBE, um modelo à escala de uma figura geométrica, um  prisma triangular, que permite ao observador apreender na sua totalidade a  forma da construção vítrea que é instalada no interior da estrutura do EMPTY CUBE.  Esta construção prismática, espelhada, tem a mesma escala e proporção da  arquitectura do EMPTY CUBE e apropria-se da sua estrutura, reflectindo-a no  interior de si mesma como uma superfície geométrica reflectora que sujeita o  observador a uma experiência sensorial, uma espécie de mise en abyme que recontextualiza o espaço, criando uma  permeabilidade entre exterior e interior que reavalia as suas potencialidades  orgânicas. Contudo, a utilização dos espelhos, recorrente na obra deste designer, convoca uma “visualidade  modernista”, como refere Maria Teresa Cruz no catálogo da exposição Introspectiva, que passo a citar: “Mas  os jogos subtis com a tridimensionalidade, a rigorosa instalação das peças no  espaço, o interesse pelos espelhos (verdadeiras máquinas de visão) – em suma, a  convocação fundamental do olhar do receptor, funcionam como uma fuga desse  mesmo paradigma modernista, um pouco à semelhança do que aconteceu na arte  contemporânea, sob influência do minimalismo, do opticalismo e da instalação.”  Neste âmbito, a peça “empty cube” revela uma forma de pensamento sobre as  condições de possibilidade da exposição como instância da experiência  perceptiva e sensorial, assente numa genealogia histórica onde nos cruzamos com  o espaço Proun (1923) de El  Lissitzky, ou com a obra Public Space/Two  Audiences (1976) de Dan Graham. 
        No presente projecto existem ainda dois níveis de  apreensão. O primeiro encontra-se na relação com a palavra, em que Filipe  Alarcão reforça essa ideia de encontro e de regresso a si mesmo, materializado  na instalação e inscrito no título “empty cube”, nomeando a obra como o lugar e  o espaço, numa lógica de apropriação que resgata o contexto e a sua componente  conceptual. O segundo nível prende-se com a relação que o espectador pode  construir com o espaço envolvente a partir da instalação e do modelo,  pré-existente, exposto na sala da galeria que acolhe o projecto, num ângulo  cego relativamente às reflexões da construção definitiva. A relação entre a  escala do modelo (o trabalho de estúdio) e a instalação permite-nos reencontrar  a dimensão projectiva do seu processo de trabalho, confrontando-nos no mesmo  espaço com uma duplicação contraditória.
      João Silvério
      Março  2013